arrombando a festa








Se, a princípio, é consenso a utilização do termo neoMPB para designar a geração 00 de músicos brasileiros que, em meio às adversidades do mercado, conseguiu desenvolver suas carreiras, o mesmo não acontece ao entrarmos em suas proposições estéticas. Aqui, encontramos um verdadeiro campo de batalha, mesmo que se pesem a tão falada influência do tropicalismo e a forte ligação com a cena noventista, principalmente a relacionada ao manguebeat e à mistura de pop e MPB desenvolvida por Marisa Monte e outros artista do período. Estas duas condições sempre se mostraram insuficientes para caracterizar a totalidade da atual produção brasileira e acabou por gerar um forte preconceito ao não endossar trabalhos que fujam de suas searas. Assim, criou-se um foco por vezes demasiadamente acentuado na cena paulistana em detrimento à de outras regiões do país – com exceção de Pernambuco, Pará e, mais modestamente, Rio de Janeiro. Mesmo que dentro dos atuais nichos viva-se uma realidade menos centralizada e seja incontestável a excelência dos trabalhos de céU, Tulipa Ruiz, Marcelo Jeneci, Leo Cavalcanti, entre outros tantos, o que se observa é a supervalorização de uma determinada cena, trazendo consigo o reducionismo da identidade da produção musical brasileira contemporânea. Sem as mesmas oportunidades, artistas de outras regiões com referências estéticas não legitimadas por jornalistas e sem a tutela dos atualmente imprescindíveis assessores de imprensa, acabam passando por grandes dificuldades ao tentarem se inserir e atuar no recém-formado mercado independente. Este é o caso, por exemplo, da cena de Curitiba, onde se avoluma uma infinidade de novos artistas e bandas que em sua grande maioria ainda não conseguiu projetar suas carreiras nacionalmente.
Um dos principais nomes desta geração, o duo curitibano Felixbravo vem, aos poucos, conquistando seu espaço neste complexo cenário. Composta por João Felix e Bernardo Bravo, a dupla lançou em 2007 o EP "Felixbravo". Em 2010, foi a vez do seu álbum estreia, “Camafeu”. No ano seguinte, em um projeto viabilizado pela Fundação Cultural, a dupla gravou um DVD no Teatro Paiol, registrando, assim, o espetáculo homônimo ao disco. Preocupados em fomentar projetos culturais em sua cidade, João e Bernardo decidiram se unir em 2009 a outros artistas, formando  a Tertúlia Produções que vem viabilizando uma série de eventos que destacam a música autoral curitibana.
Vindos ao Rio para se apresentarem no OI Futuro, João e Bernardo aceitaram o convite do Banda Desenhada para esta entrevista, realizada no Hostel Bonita Ipanema, antiga residência de Tom Jobim. A dupla falou de sua carreira, do atual cenário musical de Curitiba e também teceu críticas aos seus colegas de geração.

BD – Bernardo, você é carioca, certo? Como foi o encontro com o João e o início dessa parceria?

Bernardo Bravo – Saí do Rio em 2000, não tinha ideia do que encontraria em Curitiba. Eu era um típico playboy carioca, bem "tapadão". Chegando lá, fui ao colégio e sentado atrás de mim estava esta pessoa [aponta para João]. [Risos]. Nossa amizade começou aí. Ele já estava tendo umas aulas de música e eu precisava me enturmar. Não conhecia nada de Curitiba. Então falei: “Vamos lá, eu sei batucar”! [Risos]. Comecei como baterista. Só que sem bateria! [Risos]. Eu pegava umas baquetas e saía batendo numas latas. [Risos].

João Félix – Nessa mesma época a gente conheceu a Lívia [Lakomy]...

Bernardo Bravo – A Lívia é uma cabeçuda, uma das pessoas mais inteligentes que eu conheço. Uma guria tipo Mallu Magalhães, só que bem melhor! [Risos]. Aos 13 anos já compunha. Boa parte de suas músicas era em inglês. Ela nos chamou para montar uma banda. A Lívia é de uma família abastada de Curitiba, tinha todos os instrumentos em casa... havia uma parede repleta de CDs numerados com praticamente tudo que você pensou em ouvir em sua vida! Um puta acervo. Bem, aí montamos a banda: eu na bateria e percussão, o João no violão e o Fredy [Kowertz] no baixo, sendo substituído depois pelo Diego [Mello]. Chamava-se Aedos, uma referência aos cantadores da Grécia antiga. Sente a pilha das crianças! [Gargalhadas]. Começamos a fazer showzinhos em escolas, a galera começou a curtir, mas o Diego achava que tínhamos que fazer sucesso e a Lívia, super-recatada, curitibana clássica... muito tímida... falou: “Não, eu não quero”! E nos separamos. Na sequência comecei a compor, aprendi a tocar violão e flauta. Participei de uma banda chamada Moco junto com o Diego e o João. Eu era o vocalista e baterista, o João ficava no violão e nos vocais e o Diego no baixo. Mas acabei me cansando do formato da banda e resolvi gravar tudo sozinho. Já sabia cantar, tocar violão e batucar. Só que eu estava fazendo uma música em parceira com o João e acabei convidando-o para participar do disco... E a galera gostou. Percebi então que dava certo trabalhar com ele e o chamei para fazermos outro trabalho, para formarmos uma dupla. Unimos nossos sobrenomes, Felix e Bravo, achamos sonoro e aí nasceu o Felixbravo. 

João Félix – Fomos para o estúdio, pegamos algumas músicas, chamamos um violinista, um pianista e gravamos um EPzinho bem "molecote". [Risos]

Bernardo Bravo – E com esse EP conseguimos entrar no circuito de shows dos SESCs e fechar o contrato de edição com o dono do AR Studios aqui no Rio de Janeiro...

João Félix – Nesse meio tempo o Fredy abraçou o projeto e começou a nos produzir.

Bernardo Bravo – O nosso primeiro show foi produzido por ele. Depois que gravamos o EP mandamos um projeto pro Mecenato [lei de incentivo de Curitiba] e ele foi aprovado. Com isso, conseguimos produzir o DVD do show que estamos lançando agora.

Bernardo Bravo – Ainda por conta deste EP e, claro, pelo trabalho e dedicação da Dani [Daniela de Carvalho, assessora de imprensa] e do Fredy, saímos na Rolling Stone. Foi ai que percebemos que a coisa estava ficando séria. Eu estava fazendo faculdade de direito e ele de Educação Física. Olhamos um para a cara do outro e falamos: “Vamos profissionalizar esse negócio”! Foi assim que surgiu o “Camafeu”, nesse processo de amadurecimento da nossa história, do nosso repertório. Juntamos uma grana, chamamos os melhores profissionais que tínhamos ao nosso alcance e gravamos o álbum.



BD – Por falar em Curitiba, poderiam falar da cena de lá? Tirando A Banda Mais Bonita da Cidade, poucos são os artistas curitibanos conhecidos do público carioca. 

Bernardo Bravo – Curitiba está vivendo um momento muito interessante. Nós poderíamos indicar umas 20 bandas com personalidades completamente distintas que estão dialogando entre si, fazendo shows e atraindo um público de até 10 mil pessoas, como aconteceu na Virada Cultural de lá. E o Felixbravo é em grande parte responsável por isso. Sentíamos uma enorme falta de espaços para a música autoral. Então eu, o Fredy e o João alugamos uma casa, com um puta quintal, ao lado do museu Oscar Niemeyer. Demos o nome de Casinha e começamos a chamar alguns artistas para tocar. Depois de um tempo, produzimos a primeira festa, que se chamou “Fora da Casinha”. Começou com um público de 200 pessoas, depois 300, e foi aumentando. Muitas bandas passaram por lá: Molungo, Real Coletivo Dub, Locomotiva Duben...

João Félix – Universo em Verso Livre; o MUV, do Ricardo Verocai... 

Bernardo Bravo – Só cobras! [Risos]. E o espaço acabou dando muito certo. Encerramos um primeiro ciclo de trabalhos e, como não havia nenhum palco de produção autoral na Virada Cultural de 2010, nos juntamentos com todos esses artistas e ocupamos um bicicletário abandonado pelo governo. Na verdade, um estacionamento de bicicletas. Com a nossa grana, montamos o palco, fizemos a ligação externa, um gato na rua, e conseguimos atrair três mil pessoas para assistir aos nossos shows. No ano seguinte, a Banda Mais Bonita estourou e decidimos fazer uma nova série de apresentações. A Dani, o João, o Fred e a Nina [Nina Araújo, ex-produtora do Felixbravo] inventaram então o “Levante de Música Curitibana”. A gente se baseou na ideia de T.A.Z. [“Temporary Autonomous Zone”, livro do escritor Hakim Bey], da zona autônoma temporária. É uma teoria anarquista, sabe? A Lívia foi quem me deu o livro. Ele aborda as formas de se fazer revoluções no mundo pós-moderno. Você ataca e foge. Você agrupa, faz um flash mob [aglomerações instantâneas de pessoas em certo lugar para realizar determinada ação], causa e some. Cada um vai para o seu canto, até o momento seguinte. Para que não haja mapeamento e o governo venha atrás... E ai, tivemos essa ideia do levante. Reunimos músicos e compositores e fizemos essa nova temporada na Casinha. Tivemos um público de 500 pessoas em uma casa que só cabiam 300! [Risos]. Por conta disso, fomos capa de domingo no principal jornal do Paraná. Só que deram o nosso endereço e os eventos se tornaram muito populares. Resolvemos então terminar com essa experiência e cada um foi para o seu lado. 

João Félix – Mas conseguimos fechar o ciclo.

Bernardo Bravo – É. Deu tudo certo. A gente passou no edital da Virada Cultural deste ano. A prefeitura e o secretário de Estado da Cultura vieram conversar com a gente. Recebemos uma grana que não dava para fazer muita coisa, mas foi o suficiente para estruturarmos um palco. Tivemos um público de 10 mil pessoas. Hoje, Curitiba está passando por um momento muito massa, só que ainda não conseguimos nos expandir para o restante do país. Estamos tentando, nós, o Molungo, A Banda Mais Bonita... A Musicoteca também está bastante atenta ao cenário de lá e ajuda nessa divulgação. Quando vim ao Rio, ano passado, assisti à Banda Mais Bonita no Rival e procurei espaços para trazer o Felixbravo. Achei o Solar de Botafogo, mas teríamos que vir no custo! Putz! Ninguém conhece a gente aqui! Não encontrei um terreno fértil na cidade, sabe? Agora com o Banda Desenhada, o Oi Futuro e outros projetos que surgiram nesse meio tempo, percebo que existem pessoas interessadas em conhecer novos sons. Mas tudo é muito recente. Quando começamos com a Casinha e vimos que estava dando certo, fomos procurar outros projetos semelhantes pelo país. Para poder fazer links e nos expandir, sabe? Aí chegamos à Casa do Mancha e no Apê 80, em São Paulo, e começamos a mapear o Miradouro, a casa da Thalma [de Freitas], mas não conseguimos chegar até lá. A casa já estava vinculada ao Fora do Eixo e somos um pouco reticentes em relação às suas propostas. Então fomos tocando. Agora a nossa preocupação é descobrir uma fórmula para articular e divulgar nacionalmente os artistas de Curitiba. Não a achamos ainda, mas estamos buscando. Volta e meia a gente tenta. [Risos]. Mas isso é geral, né? Tanto os artistas de São Paulo quanto os do Rio estão se apresentando somente em suas cidades. A galera de São Paulo é massa, mas também não está conseguindo fechar, por exemplo, uma turnê pelo país com tudo bancado! Não rola! É complicadíssimo levar um show pra Curitiba. A cidade é muito árida em termos de público. Não dá para prever o que vai dar certo por lá. Também trabalho com produção e recebo convites de diversos artistas, mas geralmente não há público. Sem patrocínio, sem recursos, não consigo comprar um show sem ter prejuízo. Aos poucos, Curitiba se acostumou a apreciar a música feita por seus artistas, mas os de fora... O que conseguimos fazer e tem dado certo é bolar apresentações conjuntas, com artistas da cidade e de fora. Temos proposto isso.


BD – Voltando ao Felixbravo, a sonoridade de vocês, por vezes, parece saudosista, destoando bastante do que vem se apresentando no atual cenário brasileiro. Imagino que já tenham ouvido críticas a respeito disso...

Bernardo Bravo – A maioria das críticas foi positiva. Um ou outro jornalista pode até não gostar do “Camafeu”, mas não poderá dizer que foi mal feito, mal gravado ou mal executado. A gente realmente tentou eliminar todos os defeitos. E boa parte dos críticos entendeu isso. Teve uma revista digital, a Revista Manuscrita, que elegeu os 100 melhores álbuns do de 2010. Ficamos em 63 º lugar e a resenha dizia: “Ah, muito tradicionalista, mas não perde a beleza por conta disso”. Achei interessantíssimo. Porque acho que muitos artistas perderam o rumo da história. Quando deu o boom da indústria fonográfica na década de 80, a coisa começou a degringolar. O “Camafeu” é justamente uma resposta a isto tudo e a certos aspectos da cena atual. 

João Félix – Não criamos um projeto para que todo mundo goste ou porque é bonitinho ser assim.

Bernardo Bravo – A gente começou a ouvir o Thiago Pethit e aquela galera... Legal. Respeito. Mas acredito que eles deixaram à margem muito dos fundamentos do cancioneiro popular brasileiro que foram construídos ao longo do tempo. Essa proximidade que o Felixbravo tem com a literatura não é qualquer um que consegue ter, entende? É uma seara muito preciosa para nós, uma seara de confluências artísticas, onde a letra tem aspectos literários e há uma grande preocupação com a questão harmônica e melódica. Mas ainda assim nossas músicas são cantaroláveis. É o que o Tom Jobim, o cara que morou nesta casa aqui, fazia. Queríamos algo novo e que indicasse outro caminho, diferente do que vem sendo apresentado. O conceito do “Camafeu” veio daí. Você não vai encontrar guitarras no nosso trabalho. Não utilizamos absolutamente nada de eletrônico. Só que, ainda assim, é contemporâneo. A gente toca nos mesmos lugares que a galera do rock’n’roll! Eu sempre aviso: “Vou tocar a nossa música mais pop, o nosso hit, que é uma valsa”! [Gargalhadas]. É legal esse choque. Tem muita coisa boa sendo feita por todo o país, só que ainda existe muito preconceito. Fui ao Recife nas férias para pesquisar um pouco mais sobre o movimento armorial. Mas quando cheguei lá, parecia que nada era tão ou mais importante que o manguebeat! Sendo que o armorial aproxima erudição ao popular, com excelência técnica, mas com linhas populares. Você consegue cantarolar.  Só que há muito tempo ninguém toca neste assunto. Não achei nada de fácil acesso para a minha pesquisa. 

BD - Mas é inegável que durante o período que o Suassuna foi secretário de Cultura de Pernambuco ele se dedicou basicamente a projetos deste tipo em detrimento, por exemplo, ao manguebeat...

Bernardo Bravo – Isso é comum... A arte vive desses ciclos. Mas realmente sinto falta deste outro lado, de uma produção contemporânea que traga referências de Chiquinha Gonzaga, da música brasileira dos anos 30 e 40, da bossa nova...  Parece que tudo isso está muito distante da juventude, sabe? Mas não devia. Porque faz parte da nossa história. Nós ouvíamos nossas mães cantando essas músicas. O brasileiro tem uma tradição musical de mais de um século! Desde quando Manoel [o músico Joaquim Manoel da Câmara, 1780- 1840] levou sua modinha para o rei de Portugal. Ela já não era a mesma modinha que os portugueses trouxeram para cá. Já havia ali uma brasilidade! 

João Félix – A miscigenação. 

Bernardo Bravo – Sim! 

João Félix – Hoje em dia ficou complicado você utilizar a bossa nova como referência. Qualquer trabalho que surja e que esteja de alguma forma ligada a ela, acaba sendo visto como datado. 

Bernardo Bravo – E não é! É outra influência, é outro tempo! Por isso que a gente abriu a primeira faixa do “Camafeu” com esse verso: “Quem comparar, há de se lascar com esse novo som”. Não queremos trazer uma grande novidade com o nosso trabalho, mas, decididamente, não é mais do mesmo. É só outra realidade que se baseia em determinados parâmetros de um gênero que pode até ser considerado datado, mas que, ao ser misturado com a nossa pós-modernidade, ganha uma nova dimensão. Não é segredo. Se você for olhar, Noel Rosa e Tom Jobim faziam algo parecido com isso. Noel utilizava o samba para falar de Vila Isabel, de sua vida, do que ele tinha ali em mãos, sabe? O nosso foco é esse. Não é o novo pelo novo. Mas se você conferir o álbum, na música “Bossa ‘n’ Bossa”, por exemplo, o que parece ser um violão é na verdade uma harpa celta. Eu não acho tradicional utilizar uma harpa celta em uma bossa nova. Só que temos certo nível de sutileza. Em “Encantada”, eu queria fazer uma bossa estranha. Além da sua melodia ser em uma escala bem diferente, utilizamos banjo e cítara no arranjo. Essa foi a minha ideia de contemporaneidade. Gravamos o disco todo como se fazia antigamente, ao vivo, e pronto. Se você analisar harmonicamente, verá que há coisas pouco comuns no “Camafeu”. O que realmente me incomoda no discurso tropicalista é que com ele surgiu a ideia de “gostar de gostar”. Tudo ficou sem critério, cara. E a sua alma, cadê? Você até observa uma verdade ali no tropicalismo, existe sim um fundamento, mas é bem diferente de ficar nesse [cantarola] “papapátchubaru”. E a minha crítica em relação a essa galera que veio com o manguebeat, com a Tulipa [Ruiz], Tiê, e tal, é que alguns deles ficam nessa de “gostar de gostar”. E, somado a isso, há a figura do jornalista que fica inflamando o ego desses artistas que, sem preparo para de fato defender um álbum completo, já estão defendendo o terceiro!


BD – Mas também não deveria haver espaço para eles? Mesmo que alguns não achem o trabalho da Tiê o melhor exemplo de renovação na música popular brasileira, ainda assim há uma relevância em seus álbuns, não? 

Bernardo Bravo – Com certeza, mas o trabalho dela é tão infantil! Respeito, mas... Tecnicamente falando, não é fácil tocar música brasileira. Começa por aí. Ela não é uma música que você aprende em sua primeira aula de violão. A partir dos anos 60, vejo claramente duas escolas que passaram a influenciar a nossa produção musical: o rock dos Beatles e a bossa nova. Só que a proposta de uma é inversa à da outra, mesmo que elas tenham se cruzado no tropicalismo. São propostas totalmente distintas. E elas exigem do artista determinado estudo e talento. Eu, por exemplo, não tenho capacidade de executar os choros de Joaquim Callado [flautista e compositor brasileiro, 1848 — 1880]. A minha flauta é mais a linha do Jethro Tull. Ela é mais soprada e ritmada... Não tenho tanta capacidade técnica. Mas, cara, acho importante destacar que não é a nossa função criticar, não somos críticos de música. Nós fazemos música. E por sentirmos a falta de uma determinada cor na atual produção musical brasileira, fomos em busca da nossa sonoridade. O meu anseio artístico vai para esse norte. Porque não podemos compor uma valsa? Ou um maxixe? 

João Félix – Ou uma toada? 

Bernardo Bravo – E não é saudosismo. Mas realmente você vê que alguns artistas não superaram o passado. Uma galera maravilhosa, como o [Jaques] Morelenbaum, que não consegue se destacar do legado de Tom Jobim. Nós queremos ir além. O Brasil continua! Tom morreu. É difícil, mas existem caminhos. 

João Félix – Tem um disco do Ary [Barroso], “Encontro com Ary”, só piano e voz, que ele comenta que pretende deixar aquele registro para as outras gerações se influenciarem despretensiosamente. Essa é a ideia: usar o maxixe, o choro e outros gêneros intrínsecos à música brasileira para criar um novo ciclo. 

Bernardo Bravo – O Villa Lobos falava que as suas músicas são cartas escritas às gerações futuras. Então, acredito que temos a obrigação de pelo menos tentar compreender o que ele está querendo dizer em sua obra. Acho isso de extrema importância. Acredito que para continuarmos a produzir cultura no Brasil, devemos conhecer o que já foi produzido por aqui. Alguns só tomam conhecimento da tropicália em diante, esquecendo que a própria tropicália tem fundamento na semana de 22 . Não adianta nada criarmos na música uma realidade que não compreende a linha do tempo a qual pertencemos. Estamos em um era de Ipod, mp3 e barulhinhos eletrônicos, mas carregamos no nosso sangue a mais rica e mal divulgada musicalidade do mundo. A gente tem que dar conta desse legado. A gente tem que otimizar essa questão.




http://felixbravo.com.br/

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