nostalgia, that's what rock'n'roll is all about

fotos: daryan dornelles
“Caetano Veloso surpreende ao fazer um álbum de rock”, “Um dos melhores álbuns de rock da década”, “Caetano ganha vigor em seu retorno ao rock”... Estas frases facilmente podem ser encontradas na maioria das resenhas a respeito do festejado disco “Cê” (2006). Inspirado em bandas como Pixies, TV on the Radio, Arct Monkeys, Caetano foi ovacionado por boa parte da mídia e do público ao voltar a abraçar um gênero que, há décadas, vem sendo considerado sinônimo de contemporaneidade. O rock, presente no país desde o final dos anos 50, em maior ou menor grau, tornou-se matéria-prima para boa parte de nossa produção musical, como a jovem guarda, o tropicalismo, o samba rock, o BRock, o manguebeat e a neoMPB. Sempre em constante mutação, o gênero foi absorvido por gerações e mais gerações de músicos brasileiros em suas diversas formas: desde o rockabilly, passando pelo folk, a psicodelia, o rock progressivo, o heavy metal, o punk, o pós-punk, a new wave, até o indie rock e os seus subgêneros.
Surgido em meados do século passado no sul dos Estados Unidos, o rock tem em seu berço a forte influência do blues e da country music. Entretanto, aos poucos, o gênero foi deixando de lado suas origens e seu caráter contracultural até se tornar um dos maiores signos da cultura pop. Vinculado a um forte marketing que atrelou sua imagem a um estilo de vida transgressor e inconsequente, o rock ultrapassou facilmente os limites da música, associando-se de forma indelével à juventude e ditando regras de moda e comportamento durante toda a sua história. Contestador e excelente laboratório para experimentações, o rock, por diversos momentos, também vem sendo utilizado como mero adereço de um sem número de modismos. Talvez, justamente por este caráter dúbio, conseguiu se perpetuar, tornado-se um elemento comum à boa parte da produção musical planetária e símbolo inconteste de uma eterna e almejada juventude.
É sobre este e outros tantos assuntos que o Banda Desenhada conversou esta semana com o guitarrista e produtor Pedro Sá. Integrante da Orquestra Imperial e da Banda Cê, com a qual acompanhou Caetano Veloso em seus últimos álbuns, Pedro também integrou a extinta e cultuada banda carioca Mulheres Q Dizem Sim, juntamente com Domenico Lancelotti, Palito e Maurício Pacheco. Considerado um dos grupos responsáveis pela atual cena musical brasileira, lançou apenas um álbum, em 1994, pela gravadora Warner. Sob a alcunha de Mike Balloni, Pedro participou depois da divertida e pouco conhecida Goodnight Varsóvia (também chamada Gold Nigth Varsóvia ou Gold Nyte Warsawa), ao lado de Kassin, Léo Monteiro, Moreno Veloso e Maurício Pacheco. O guitarrista  esteve presente ao lado de Lenine nos álbuns "O Dia que Faremos Contato" (1997) "Na Pressão" (1999) sendo, pouco tempo depois, convidado por Caetano Veloso para participar do “Noites do Norte” (2000), dando início assim à parceira que se estendeu nos anos seguintes. Paralelamente, Pedro colaborou com o projeto +2 e foi responsável por produzir o álbum de estreia de Rubinho Jacobina, “Rubinho e Força Bruta” (2005). Integrando a banda Cê, ao lado de Marcelo Callado e de Ricardo Dias Gomes,  o guitarrista foi responsável, juntamente com Moreno Veloso, pela produção de “Cê” e “Zii e Zie”(2009). O músico também participou do recente retorno de Gal Costa aos estúdios, gravando com sua guitarra o álbum “Recanto” (2011). Entre outras tantas iniciativas, Pedro ainda desenvolve, ao lado de Domenico, o projeto de improvisação “Vamos Estar Fazendo” e produz os novos álbuns de Rubinho Jacobina e de seu irmão, Jonas Sá, além  do disco de estreia de Moreno Veloso, com quem realizou uma série de shows intitulada "Parque 72".
Decididos a entender um pouco mais sobre a origem da atual produção músical brasileira, convidamos Pedro Sá para uma entrevista, onde o músico nos contou de sua carreira e deu opiniões sobre a atual cena:

BD – Como você vê esta conexão entre Caetano Veloso e a sua geração? Imagino que exista um peso em ser produtor de um artista como ele...

Pedro Sá – Sim. Tem um peso. Acabei ganhando uma visibilidade muito grande. As pessoas ficaram mais atentas ao que faço. Mas, por outro lado, foi um processo supernatural. Tanto o convite quanto a própria produção. O trabalho que o Caetano propôs estava totalmente inserido na minha linguagem. Acho até que ele se inspirou um pouco na própria banda. Houve uma troca, uma simbiose. E foi bem tranquilo. Não senti nenhum medo. Até porque conheço o Caetano há muitos anos. Ele é pai do Moreno, meu amigo desde o colégio. Mas, realmente, você acaba tendo uma exposição muito maior e precisa tomar mais cuidado com as coisas que fala. [Risos].

BD – E como foi essa troca? De um modo geral, a crítica deu muito destaque ao retorno de Caetano ao rock e chegou a aportar isto como um sinal de renovação. Mas, afinal, falar em pleno século XXI que o rock é inovador não soa anacrônico?

Pedro Sá - “O rock é a música da juventude”. Esta é uma leitura grosseira, né? [Risos]. Desde os anos 50 que a gente escuta isto. Pensando assim, bossa nova também é a música da juventude. Eu entendo o que você está falando. Acaba sendo um discurso antigo, clichê. O “Cê” e o “Zii e Zie” têm uma linguagem rock: guitarra, baixo, bateria... Mas já são outra coisa. O próprio Caetano classifica as músicas de transambas e transrocks. O interessante ali é a experimentação e também esta aproximação que ele fez com o pessoal da nova geração, com os seus contemporâneos. O Caetano sempre teve isto, de se antenar com o que está rolando. Ele é muito ligado nas coisas que se passam ao seu redor. Eu já venho trabalho com ele desde o "Tropicália 2". Gravei no disco e toquei nos shows. Também participei dos “Noites do Norte” [2000] e “A Foreign Sound” [2004]. No “Cê” ele procurou se aproximar mais de uma linguagem de banda. E, naturalmente, o trabalhou se tornou contemporâneo. Talvez o que a gente faça tenha alguma novidade que acabou interessando o Caetano. Ele é muito criativo e veio com uma enorme vontade. Acho que poucos sabem, mas muito do que está no disco partiu dele: ideias musicais, de arranjo, do que a bateria e o baixo deveriam fazer. O Caetano é um compositor incrível. E, nestes últimos álbuns, acho que soube se adequar e se inserir no que vem acontecendo na música brasileira. E se renovou. O que é o processo natural de qualquer artista. Você não pode fazer a mesma coisa sempre.

BD – Mas você não acha um pouco desmedida esta cobrança pelo novo? É tão terrível assim em dado momento de sua carreira você ser um pouco repetitivo? Não vejo nenhum demérito, por exemplo, em Chico Buarque continuar com um trabalho tão linear, embora a imprensa, de um modo geral, acabe por achá-lo um tanto datado.

Pedro Sá – Pois é, João Gilberto é totalmente repetitivo e maravilhoso! Ele canta as mesmas músicas. Parece que de propósito.  Regravou milhões de vezes os mesmos sambas. E eu continuo adorando. Mas a cobrança da qual você falou não vem do público. É uma cobrança de uma determinada parte da imprensa, de uma determinada parte do público especializado. Porque a maioria das pessoas prefere que você toque o grande sucesso. Acho louvável o artista procurar fugir disto, fugir desta acomodação. O próprio Chico não toca mais “A Banda”, por exemplo. Porque ele, dentro do seu trabalho, também procura não ser redundante. Mas é um caminho difícil. 

BD – É interessante constatar que boa parte da nova música brasileira tem influência do tropicalismo. O que acaba por gerar um ciclo, onde Caetano, Tom Zé e Gal se renovam ao se envolverem com músicos que foram influenciados diretamente por seus trabalhos...

Pedro Sá – É. Temos claramente esta influência da Tropicália. E Caetano acabou percebendo isto e a utilizou em seus discos. Como uma espécie de retorno, só que com outro foco, de outra forma. O tropicalismo desatou um nó que havia na música brasileira em relação a ser daqui e, ao mesmo tempo, ter influências do que vem de fora. Eles conseguiram resolver esta questão de uma maneira mais inteligente do que o rock dos anos 80, por exemplo. Eu gosto muitíssimo das bandas dos anos 80, Paralamas [do Sucesso], Ultraje a Rigor, Titãs... sou muito influenciado por elas, mas acho que existe ali um aspecto subdesenvolvido. De simplesmente copiar o que estava sendo feito lá fora. Você pode ver, todas aquelas bandas são um pouco assim. Já a Tropicália, por conta da antropofagia, consegue ir mais além, digerindo todas as influências e criando outra coisa, com uma cara nova. Então acabei me identificando mais com esta ideia do que com a do rock dos anos 80. Eu era adolescente nesta época. Minha geração era justamente o público alvo destas bandas. Mas sentia que faltava alguma coisa ali e, olhando um pouco para trás, percebi que o tropicalismo já havia apontado e resolvido todas as questões e de uma forma mais profunda.  


BD – Alguns jornalistas e pesquisadores comentam que a atual cena musical brasileira se originaria de bandas como Mulheres Q Dizem Sim e o Acabou La Tequila. Você concorda com isto?

Pedro Sá – Eu acho que é isto mesmo. Na época a gente sabia que o que estava fazendo era algo diferente. Sabíamos que tínhamos outra linguagem. Acho pertinente você tocar neste assunto. Porque o disco do Mulheres Q Dizem Sim foi produzido por uma grande gravadora. E o nosso som realmente já apontava para outra coisa. O próprio disco foi gravado de uma maneira muito crua. Eu era muito radical com esse negócio de reverb. Não podia ter! Eu queria um disco seco. Nos anos 80 havia uma mania de reverb! Reverb no bumbo, reverb na caixa... era um negócio muito chato. Você conhecia uma banda maneira, mas quando ela ia gravar, ficava uma merda! Eu queria que o disco do Mulheres Q Dizem Sim soasse como o show. Acho que isto tem muito a ver com a linguagem musical de hoje. Veja a quantidade de discos que foram gravados ao vivo no estúdio, sem edição. O Mulheres já havia feito isto há bastante tempo. 

BD – Há quase 20 anos.

Pedro Sá – E não soa antigo. Eu tive escutando... Claro que tem coisas datadas, óbvio. Mas a sonoridade tem muito a ver com o que está rolando. 

BD – É interessante estas suas colocações, porque cai um pouco por terra aquela ideia de que a cena carioca é tão despojada que a sua existência se dá muito mais ao acaso do que por uma busca estética...

Pedro Sá – Mas a maneira de fazer é completamente esta, cara. [Risos]. Com certeza. Totalmente intuitiva e sem a menor amarra. Quando  fizemos o disco, não havia um conceito, nem muito menos a pretensão de estar fazendo um som novo. A gente não tinha isto. Mas sabíamos que o que estávamos fazendo ali não era a mesma coisa do que vinha sendo feito. Por conta disto, tivemos dificuldades com a gravadora. Ela não sabia aonde nos incluir! Éramos “adulto contemporâneo”! [Risos]. Nós nos achávamos pop, mas não éramos tão pop quanto o Skank, por exemplo. E também nos achávamos um pouco experimentais! Mas, na verdade, nunca acreditamos que fosse tão importante assim ter um conceito. Você pode notar que na música feita em São Paulo isto é importante. É necessário que você saiba o que está fazendo. O próprio tropicalismo também tem isto. O Caetano possui esta consciência e sabe teorizar a respeito do seu trabalho, embora, no fundo, faça de uma maneira muito intuitiva. Acho que para nós do Rio, ter um conceito é algo flexível: pode ter, pode não ter. Somos mais relaxados, mais despojados. A gente faz e depois pensa o que é! [Risos].

BD – Em sua entrevista, Kassin disse que ouvia Meshuggah e li que você participou de uma banda de heavy metal. Estas referências entram, em algum momento, no trabalho de vocês? 

Pedro Sá - Eu participei?! [Risos].

BD – “Pedro Sá, começou como guitarrista de uma banda de heavy metal”. Está escrito no Myspace da Orquestra Imperial! [Risos].

Pedro Sá – Ah! O Goodnight Varsóvia! Era uma banda de quase metal! [Risos]. Fictícia e superengraçada. Cada um dos integrantes tinha um pseudônimo. O metal realmente é uma influência. A gente acha divertido. Até pelo lado caricato. É um rock branco, né, cara? É o rock sem rock’n’roll. Quando o rock embranqueceu de vez! [Risos]. O metal pode ser muito cômico e teatral. A questão do virtuosismo... Eu me lembro que tinha um cara no Leblon, que morava em uma casa na [rua] Cupertino Durão... Ele tocava pra caralho! Era supervirtuose! Mas era tão virtuose que acabava virando uma piada! Se por um lado ele era impressionante, até porque a gente era adolescente, por outro era muito engraçado! Tem uma hora que aquilo fica muito distante da música. Então acho que a gente incorporou um pouco este lado cômico do metal. Sem falar que eu gosto muito de Black Sabbath! Acho uma banda fodaça. Os três primeiros discos são perfeitos [“Black Sabbath”, 1970; “Paranoid”, 1970; e “Master of Reality”, 1971].  Eles têm um lado muito básico. Lembram um pouco o punk rock, eu acho. Aqueles riffs de guitarra... a banda resolve tudo com poucos elementos. Eu me identifico muito com isto. A própria deficiência do Ozzy faz com que ele tenha saídas musicais bem interessantes. Outro dia, vi com o Kassin um filme que ele baixou. Cara, era bem do começo do Black Sabbath. Muito bom! Tommy Iommy com aquele cabelo, parecendo um robô gigante! [Risos]. E o Ozzy bonitinho, novinho.


BD – Você também vem trabalhando em um projeto de improvisação com o Domenico. Como surgiu a idéia do “Vamos Estar Fazendo”? Houve uma apresentação no MAM no ano passado... Ele terá continuidade?

Pedro Sá – “Vamos Estar Fazendo”... engraçado né? Parece coisa de telemarketing. [Risos]. É uma brincadeira com isto. Fiz o convite para o Domenico. Pensei em chamá-lo porque já tocamos há muitos anos e em muitos projetos. Antes dos Mulheres Q Dizem Sim, a gente já tocava no colégio. Então ele é um parceiro musical muito antigo. Assim como o Moreno e o Kassin. Sempre tivemos um momento de “levação" de som, de cada um pegar seu instrumento e sair tocando. Sempre. Em passagens de som, ensaios... às vezes esperando alguém que se atrasou para o ensaio... E destas experiências saem várias ideias. Então achei que seria interessante fazer isto com uma platéia, sabe? Apresentá-lo como prato principal e não como contorni. Nós nos reunimos para tocar várias vezes, primeiro no café do teatro do Solar [de Botafogo]. Começamos de uma maneira bem informal, tocando por tocar, fazendo as músicas na hora, mas com público, o que dá certa responsabilidade àquilo tudo. Não era só uma parada viajandona e foda-se todo mundo. Era uma apresentação. E, cara, tem umas coisas maravilhosas que você não acredita que são improvisações. A gente esta fazendo um DVD. O Dani [Carvalho], o nosso técnico de som, tinha uma camerazinha HD e filmou um show na Casa da Gávea. Que, aliás, foi o máximo. Ali tudo ficou mais concentrado. Éramos só nós dois. Foi lindo. A própria casa também filmou o show. Então tivemos duas câmeras. O Dani também voa de asa delta e tem umas imagens ótimas que ele e o Domenico misturaram na edição! [Risos]. Cara, juro, ficou muito maneiro! Queremos lançar este material com mais algumas coisas que gravei destes shows. Mas ainda estamos pensando. Temos muito material e precisamos concentrá-lo de um jeito que fique bacana de escutar, que não seja chato. 

BD – E o"Parque 72"? Parece que esta série de shows serviu de laboratório para vocês aprimorarem o repertório do álbum do Moreno, não? 

Pedro Sá – O “Parque 72” foi legal pra caramba! Muito do que a gente fez ali serviu como encaminhamento para o disco do Moreno. Claro, não é a mesma coisa, mas, de algum modo, ajudou na hora dele agrupar as músicas que estava compondo. Foi mais ou menos na mesma época do “Vamos Estar Fazendo”. Eu já vinha pensando há um bom tempo em fazer alguma coisa com o Moreno. Mas, na verdade, foi a minha mulher, a Inti, que deu a ideia. A gente recebeu um convite para tocar em um restaurante que a madrinha dela costuma ir, lá em Punta del Diablo, no Uruguai. A Inti achou que eu deveria chamar alguém, um amigo, e que este poderia ser o Moreno. Achei a sugestão ótima. Queria fazer algo com pouca instrumentação, deixando bem clara a maneira como o Moreno canta e dando espaço para que ele pudesse tocar pandeiro. O Moreno quase nunca faz isto e é bom pra caralho! Foi bem legal, porque este projeto também me permitiu cantar, coisa que faço muito pouco. Foi uma ótima oportunidade. Eu e o Moreno temos uma longa história musical. Ele também participava do Mulheres Q Dizem Sim. Não chegou a integrar a banda, mas ia aos ensaios. Ele adorava e, às vezes, cantava com a gente. Então achei ótimo o convite desse restaurante. Foi o Moreno que deu este nome, “Parque 72”, e os shows foram ótimos! Agora estou produzindo o seu primeiro disco. Já está quase pronto. Também estou produzindo os novos trabalhos do Rubinho Jacobina e do meu irmão, o Jonas. Além de estar ensaiando com a Orquestra para o nosso novo disco! Então é muito trabalho. Muita gravação... 

BD – Você nunca trabalhou tanto como produtor.

Pedro Sá – Na verdade, sempre produzi: os do Caetano, o primeiro do Jacobina, o do Ronei Jorge [Ronei Jorge e Os Ladrões de Bicicleta, “Frascos Comprimidos Compressas”, 2009 ]... Adoro produzir. Mas o meu lado produtor surge muito por conta de uma visão comunitária que tenho, de galera, de tentar fazer valer os talentos dos meus amigos. Não sou o chefão das mixagens como o Kassin. Ele sempre foi “o produtor”! Antes mesmo de pensar em ser! [Risos]. E eu não... Sou mais relapso, gosto de produzir trabalhos que tenham alguma relação artística comigo. Talvez eu seja um pouco menos profissional neste sentido! [Risos]

BD – As pessoas devem lhe cobrar um álbum solo, não?

Pedro Sá – Cobram todo dia! Eu sempre escuto: “Pô, você não vai fazer seu disco”? Eu tenho às vezes esta vontade e, com certeza, vou fazer alguma coisa em alguma hora, mas também acho importante ressaltar que, para mim, todos os trabalhos que faço são meus, entende? Os discos do Caetano, do Jacobina e da Orquestra Imperial são meus também. O mesmo vale para o disco do meu irmão que estou produzindo. No “Kassin +2”, toquei baixo o disco inteiro, então eu o considero meu. Tenho um ego bem fluido e pouco definido! [Risos]. Que vai se misturando com o dos outros. Também acho um pouco careta o formato de álbum com canções. Não sou contra, de jeito nenhum, adoro, mas para mim, para o meu ímpeto artístico, não. Todo mundo já fez tão bem... Costumo fazer canções, mas têm outras coisas que me interessam mais e sei que posso contribuir de outro modo. 

BD – Neste aspecto você se assemelha muito à Thalma que, também pertencendo à Orquestra, é cobrada constantemente por um trabalho solo, mas que acaba se enveredando por outros projetos.

Pedro Sá – Nunca tinha pensado nisto! [Risos]. Mas tem a ver. A Thalma realmente é uma das pessoas mais musicais que eu conheço. Ela é incrivelmente musical. Talvez justamente por ter esta eloquência , sinta alguma dificuldade em ter um foco. A Thalma entra na onda com muita facilidade. Ela vai com tudo no que acredita e sempre se sai superbem. A Orquestra Imperial é foda, porque é um pessoal que eu conheço há muito tempo. O Rubinho e o Kassin eram meus amigos de colégio. E de repente todos se uniram ali. É muito bacana e significativo para mim. A Orquestra é um celeiro de diversão! [Risos].

BD – E mesmo não podendo ser chamada de movimento, a Orquestra sintetiza boa parte do que é feito na atual cena carioca...

Pedro Sá - É interessante você falar isto, porque acho que já se pode dizer que a Orquestra é um movimento, digamos assim, mas sem ter a petulância do que se espera de um movimento tradicional, que muitas vezes deprecia o que veio antes: “Não, agora isso aqui é o novo! Isso aqui é o bom”! A Orquestra não, ela sempre foi uma coisa meio improvisada. A gente vai fazendo, vai juntando... e tudo vai acontecendo de uma forma bem natural. Acho que a Orquestra é uma influência mais pela sua maneira de criação e por sua formação do que propriamente pelo estilo musical. É um formato aberto de banda, não é um clube fechado. Você pode ir a cinco shows seguidos da Orquestra e ver cinco formações distintas. Vejo que muitas bandas de hoje adotaram isto: formações meio mutantes, mas que representam uma mesma turma. E não é que as peças sejam substituídas, simplesmente em algum show o guitarrista, vamos dizer assim, titular, não pode ir e o reserva entra. Mas ele também é parte daquela galera e tem liberdade para tocar do seu jeito. E isto é validado por todos. É uma coisa meio jazzística, mas dentro da ideia básica de bandas de rock. Na Orquestra também há uma enorme liberdade estilística, a gente realmente mistura de tudo, mas sem o compromisso de ter que mesclar elementos distintos. É algo realmente muito livre e espontâneo. No entanto, vendo de fora, acho que isto acabou criando uma identidade. E esta atitude tem a ver com muitas bandas que vieram depois da gente. Antes estas junções eram vistas quase como bandeiras: "a banda que mistura samba com rock", "a banda que mistura maracatu com metal" ou " a banda de axé com noise”... como se fossem fórmulas estilísticas, entende? Nós nunca ligamos muito para isto, sempre nos sentimos com liberdade para seguir o nosso gosto musical da maneira mais divertida. Talvez isto tenha influenciado direta ou indiretamente as bandas mais novas.




http://www.myspace.com/orquestraimperial

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