e o tal do mundo não se acabou...


1/2 dúzia de 3 ou 4 (da esquerda para a direita): marcos mesquita, daniel carezzato, thiago melo e luciana bugni | fotos: daryan dornelles



Web 2.0. Com o enorme avanço tecnológico da última década, a cultura de massa e, principalmente, as grandes e tradicionais mídias se viram desestabilizadas e imersas em sua pior crise. O acesso à internet e à banda larga propiciou o desenvolvimento de uma sociedade virtual e continuamente conectada que tem como uma de suas principais características o compartilhando gratuito de arquivos e conteúdos, o que, para muitos, representa uma irrefreável democratização do conhecimento. Entretanto, este avanço também representou, inequivocadamente, uma retração em toda a indústria de entretenimento que até então conhecíamos: Filmes hollywoodianos tiveram suas bilheterias drasticamente reduzidas por conta de downloads e DVDs piratas; livrarias e lojas de discos especializadas fecharam suas portas graças à enorme facilidade de compartilhamento de textos e músicas; jornais, revistas e emissoras de rádio e TV constataram a redução  expressiva em suas vendagens e audiências graças ao sucesso do Youtube e blogs com conteúdo gratuito. Este novo cenário fez com que um sem número de vozes se levantasse e rebelasse contra o inegável desrespeito à propriedade intelectual. Assim, a contragosto, nos últimos anos os EUA parece amargar o fim de uma era que foi marcada por uma próspera indústria de entretenimento e de veículos de comunicação até então considerados por muitos, de forma um tanto obtusa, os grandes guardiões da cultura e da verdade.
Porém, mesmo que esta crise também tenha solapado a produção cultural brasileira, ela foi responsável pela ascensão de uma nova cena musical, em sua esmagadora maioria independente, que em outros tempos jamais teria a oportunidade de difundir seu trabalho ou dialogar, mesmo que modestamente, com a grande mídia. Exemplos não faltam: Rabotinik, o quarteto carioca de música experimental, não só conseguiu financiar seu primeiro álbum através de crowdfunding como participou do último trabalho de Gal Costa, lançado pela major Universal Music. Outro exemplo é a Bande Desinée, banda pernambucana cujo repertório autoral é basicamente cantado em francês com algumas inserções de italiano e português e que já obteve mais de seis mil downloads de seu álbum de estreia, “Sinée qua non”. Paralelamente e servindo de apoio para a sua divulgação, também surgiu no país um grande número de blogs escritos por diletantes que vieram corroborar a até então limitada cena da música independente brasileira. Mas, se por um lado temos agora ao nosso alcance centenas de artistas nacionais produzindo trabalhos criativos e de qualidade, estes mesmos se vêem na necessidade de disponibilizar gratuitamente seus álbuns, aguardando de forma esperançosa que a visibilidade em algum momento se converta em retorno financeiro ou que algum de seus projetos seja aprovado em editais públicos ou em sites de crowndfounding. Polêmicas à parte,  fato é que só com a democratização da internet e o crescimento das redes sociais se tornou possível, pelo menos no Brasil, a renovação do cenário musical com o surgimento de artistas das mais diversas partes do país com liberdade criativa e isentos de qualquer manipulação das grandes gravadoras.
Este também é o caso da banda paulistana 1/2 Dúzia de 3 ou 4: Com um som pouco convencional, crítico e bem humorado, influenciado pela vanguarda paulistana, o grupo acaba de finalizar o seu segundo projeto, “O fim está próspero - a trilha sonora (oficial) do fim do mundo”. Iniciado em 2010, consistiu, ao longo de dois anos, no lançamento bimestral de uma música e seu respectivo vídeo abordando temas apocalípticos inseridos no contexto da época. Formado atualmente por Thiago Melo (violão e voz), Daniel Carezzato (percussão e voz), Marcos Mesquita (baixo), Arnaldo Nardo (bateria), Luciana Bugni (letras), Mike Reuben (sax, flauta e voz) e Sérgio Wontroba (clarineta e voz), o grupo surgiu em 2002 e, em 2008, lançou seu primeiro álbum, “Tudo se torna”. No ano seguinte, apresentou-se no Festival MOLA (Mostra Livre de Artes), no Circo Voador (RJ) e, em 2010, no Festival MACACO (Movimento Artístico e Cultural do CAASO), em São Carlos (SP), além de realizar constantemente shows   no circuito SESC paulista.
Chamado para se apresentar em uma festa do PodCast Caipirinha Appreciation Society, às vésperas do ano novo no Rio de Janeiro, o 1/2 Dúzia de 3 ou 4 também foi convidado pelo Banda Desenhada para uma divertida entrevista:

BD – A ironia e o humor de suas canções remetem à vanguarda paulista e, principalmente, ao Premeditando o Breque. Eles realmente influenciaram o trabalho de vocês?

Thiago Melo – Estas influências vêm desde que me entendo por gente. Aprendi a ouvir música com o Premê, com oito anos de idade. Foi ali que juntei o "lé" da letra com o "cré" da melodia e entendi que era possível contar uma história por meio de uma canção. Logo depois, conheci o Língua de Trapo, Itamar [Assumpção], Arrigo [Barnabé] e percebi a complexidade dos arranjos e a importância desse movimento. A culpa disso tudo é da minha família, sobretudo dos meus tios Helio Filho e Zé Salathiel que, em 83, trouxeram a tal vanguarda para Laranjal Paulista, minha cidade. Com certeza, essa referência foi muito importante pro 1/2 Dúzia. 

Marcos Mesquita – Escutei muito rock quando era moleque, muito mesmo, até coisas mais pesadas. Fui começar a gostar de jazz, de música brasileira de verdade...

Thiago Melo – Como o jazz! [Gargalhadas].

Luciana Bugni – O jazz de raiz! [Risos].

Marcos Mesquita – [Tentando continuar sua fala] Isso depois dos dezesseis anos...

Thiago Melo – O jazz universitário! [Gargalhadas].

Marcos Mesquita – Posso falar?! [Gargalhadas].

Thiago Melo – Pode!

Marcos Mesquita – No fundo a banda possui referências bem distintas... 

Sergio Wontroba – Eu curtia rock progressivo e música instrumental, mas acabei indo para a música erudita quando comecei a estudar teoria.

Marcos Mesquita – Gosto e ouço bastante música instrumental, como Hermeto Pascoal, Jaco Pastorius, Dixie Dregs... Então o que acabo trazendo para o 1/2 Dúzia, além das composições, é a questão dos arranjos, das harmonias. 

Daniel Carezzato – O 1/2 Dúzia começou com um duo. O Thiago trouxe as composições e seu violão torto influenciado pelos paulistas e por Tom Zé, e se juntou com o Marcão que tem esta pegada do jazz, da convenção. Foi desse encontro que nasceu o “Tudo se torna”, o primeiro aglomerado de músicas, em 2009.

Marcos Mesquita – Em seguida veio a voz da Lia Bernardes [que se desligou da banda neste ano], o Mike Reuben com seu sax e flauta à la Jethro Tull...

Mike Reuben – Faço um som de experimentação, de estranheza. Afinal, o 1/2 Dúzia faz um som que é no mínimo estranho! Quando o pessoal surge com uma música nova, ela demora para assentar, para ser assimilada. No início, fui entrando na banda devagarinho, como quem não quer nada, e com o tempo fui deixando uma marca. Nessa época todos contribuíam com os arranjos, um processo meio anárquico, mas muito criativo. 

Marcos Mesquita – E também veio o Daniel, na voz e na percussão. Ficamos com essa formação por uns dois anos, até a gente se render ao poder da batera do Arnaldo Nardo. 

Arnaldo Nardo – Tive dois ensaios para tirar todas as músicas e elas tinham essa forma toda esquisita, sem pé nem cabeça. Deu trabalho. Eu trouxe influências minhas como o Gigante Brasil, Nenê Batera, Paulinho da Viola... E o 1/2 Dúzia me fez correr atrás de outras influências. Escutei “Sem pedir licença” e a música me lembrou de "Underground", o filme de Emir Kusturica. Fui buscar informações sobre a trilha, para ter mais material, e descobri que a banda já tinha Kusturica como referência.

Marcos Mesquita – Quando faltavam apenas duas músicas para concluir a gravação do “Tudo se torna”, o Thiago convidou um clarinetista para tocar na “Pô, Christina” e chegou um tal de Sérgio Wontroba e colocou ordem na casa. 

Sergio Wontroba – O Thiago me chamou e comecei a pesquisar sobre eles e gostei muito da banda. Queria tocar! Em “Pô, Christina”, me deram carta branca para fazer o arranjo que quisesse. E gostaram do tipo de sonoridade. Mostrei parte do que eu havia escrito e consegui que eles me chamassem para entrar no 1/2 Dúzia. [Risos].

Luciana Bugni – Ainda bem.

Arnaldo Nardo – Foi perfeito, pois o Sergio organizou e arranjou esse caos criativo.

Sergio Wontroba – Se eu trouxe algo pro 1/2 Dúzia foi uma organização de método, mas a banda quebrou vários paradigmas em relação ao meu próprio método. Parece contraditório?

Marcos Mesquita – Não... [Risos].

Arnaldo Nardo – As referências musicais e a forma como o 1/2 Dúzia trabalha me fizeram mudar o jeito de pensar. Na banda tudo é feito de maneira bastante livre, sem formalidade. 

Mike Reuben – O que vale é a formação eclética dos músicos, que dialogam com várias linguagens e que ajudam a compor essa história. 

Daniel Carezzato - Desde então nós ganhamos este perfil. Se você reparar, os arranjos são cheios de pegadinhas. Não conseguimos, de um dia para o outro, chamar um músico substituto. Se ele não entender a nossa lógica, não vai conseguir tocar com a gente. Tem que conhecer as sacanagens das músicas. 

Arnaldo Nardo – Teve até um caso em que não pude tocar e mandei um amigo. Resultado: o cara praticamente saiu correndo, fez um ensaio e não voltou nunca mais. 

Thiago Melo – Esta é a nossa característica principal: O anticlímax, a sacanagem, no mal sentido, claro. [Risos].

Marcos Mesquita – E essas sacanagens nos causam um grande problema nos shows. Como as músicas costumam acabar de repente, as pessoas tomam um susto e não aplaudem. 

Luciana Bugni – É melhor pensar assim...

Marcos Mesquita – Fica aquele silêncio constrangedor. [Risos]. Às vezes precisamos avisar que a música acabou! [Risos].

Daniel Carezzato – E mesmo assim, ninguém aplaude! [Risos].

BD – Voltando à vanguarda paulista, está ocorrendo nos últimos anos uma espécie de redescoberta desta cena...

Daniel Carezzato – Sim. Está havendo uma retomada. Estou sentindo isto, principalmente em São Paulo. As homenagens que fizeram ao Itamar, a "Caixa Preta" [caixa com doze CDs, contendo toda a sua carreira discográfica], a comemoração aos trinta anos da Lira Paulistana... E ainda tem os Novos Paulistas que estão aí. Apesar de não fazemos parte deste grupo, crescemos com eles.

BD – O que acho interessante é que esta nova geração acabou sendo inserida, ao seu modo, na grande mídia, com reportagens em diversos jornais e revistas e tendo seus discos inseridos entre os melhores do ano. Parece existir uma visibilidade que na época da vanguarda paulista era impossível de se obter.

Thiago Melo – Acho que aquele era o momento da vanguarda paulistana. Eles estavam ali, pulsando, desconstruindo, construindo e revertendo toda a lógica, mas chegou um tal de rock'n'roll, a moçada de Brasília, os Titãs, o Barão Vermelho... E o foco mudou... Rock é rock, pô! Se eu fosse o Chacrinha, é lógico que iria colocar essa moçada na tela. Antes tudo era determinado por 1/2 dúzia de gravadoras e três ou quatro canais de rádio e TV. [Risos]. Quando o rock roubou a cena da vanguarda, ela caiu num ostracismozinho, mas o povo da Lira comeu pelas beiradas e agora, com a tal da internet  e com as pessoas podendo escolher o que realmente querem ouvir, voltou-se a olhar para este momento importante da história da música brasileira.

Marcos Mesquita – Mas não sei se realmente a vanguarda foi abafada, porque ela não possuía o mesmo apelo pop dos Titãs, por exemplo.

Thiago Melo – Não, claro que não.

Marcos Mesquita – Então não sei se abafa... O público é mais restrito de qualquer forma, não dá para competir.

Thiago Melo – Abafa! Claro que sim! É rock'n'roll, cara! 

Marcos Mesquita – Então vai ouvir o solo de guitarra do Manga na “Fim de semana” [música do grupo Premê] e me diz se não é rock.

Thiago Melo – É rock.

Daniel Carezzato – É rock.

Luciana Bugni – É rock, mas é leve. O boom do pop rock nos anos 80 era reflexo do que vinha rolando nos 70 fora daqui. Era novidade de todo lado.

Daniel Carezzato - Naquela época era a indústria fonográfica que mandava. 

Thiago Melo – E contava vantagem... Veja os “Mulheres Negras”: a gravadora simplesmente decidiu não dar mais voz para um projeto bom daquele! Agora eles estão voltando de assalto, retomando uma história que só é possível por conta da internet.


BD - Já classificaram a música de vocês de experimental e, decididamente, ela não é pop. Alguns críticos desta geração falam que ela faz música para o próprio umbigo. O que vocês acham disto?

Luciana Bugni – Mas fazemos crônicas musicais sobre assuntos que supostamente interessam a todo mundo... Não concordo com essa coisa de umbigo não... De fato, não é fácil de digerir. É algo para se ouvir prestando atenção e o anticlímax dificulta um pouco mesmo. Aí ou você desiste ou persevera. Vai do umbigo de cada um. [Risos].

Marcos Mesquita – São crônicas, mas também tem muita piada interna...

Thiago Melo – Eu gosto do meu umbigo e ele não é pra qualquer um. [Risos]. Mamãe fez direitinho. Não pretendo ganhar a vida com música. Nosso trabalho é de formiguinha e não pertencemos a nenhuma panelinha. As poucas pessoas que são tocadas pelo nosso som são suficientes para me fazer feliz e contar uma boa história para os meus netos, se eu não morrer de fome até lá. [Risos].

Daniel Carezzato – Das duas, uma: Ou eu morro pobre ou eu não morro. [Risos].

BD – De um modo geral, todos os artistas independentes reclamam da questão financeira. Muitos têm que trabalhar em outras áreas para poder pagar as contas do mês. 

Luciana Bugni – Nem precisa ser independente, né? Até o pop tem suas dificuldades... É que a gente tem mesmo outros empregos e é isto que nos banca. Reclamar não vai mudar muito a situação. É difícil viver de arte, ponto.

Marcos Mesquita – É que o nosso caso é o contrário. A gente não tem grandes pretensões. Ninguém saiu de seu emprego para se focar apenas na carreira musical. Temos o nosso trabalho, temos que entrar tal hora, temos que sair tal hora... 

Luciana Bugni – Uma vez, o Arnaldo teve de sair correndo de um show do outro lado da cidade e pegar as baquetas com o 1/2 Dúzia já no palco. Eu achava que não ia dar tempo.

Daniel Carezzato – Enrolei o público o máximo que pude.

Sergio Wontroba – Resumindo, todo mundo faz mil coisas para ganhar a vida e no fim a gente consegue fazer tudo pelo 1/2 Dúzia.

Thiago Melo – Madrugada taí pra que, né? [Risos]

Luciana Bugni – Para ir pro estúdio ou para ficar na internet compondo...

BD - A internet tem sido vista como a grande salvadora da cena independente. Mas ela ainda não consegue, pelo menos no Rio, encher as casas de espetáculos com nomes da nova geração, excetuando os mais populares. Ao que parece, o mundo virtual ainda não resolve tudo, ou resolve?

Thiago Melo – Pô, e o Criolo naquele Circo Voador abarrotado? A Tulipa [Ruiz] rodando o mundo, o  C.A.S. [Caipirinha Appreciation Society] entre os 10 podcasts mais acessados do planetinha, espalhando músicas como as nossas, que jamais cruzariam o Atlântico, que dirá o Pacífico? É claro que depende das pretensões do artista. A gente vai até onde o nosso dinheiro e a boa vontade das pessoas que gostam da gente alcançam. Mas, se você perguntar se já vendemos muito, posso lhe garantir que sim: vendemos um Chevette, dois videocassetes e um jogo de louça da tia-avó do Marcão. [Risos].

Marcos Mesquita – Este último ela não sabia... [Gargalhadas]. Mas a internet ajudou bastante a manter a banda viva durante os dois anos em que nos concentramos no segundo projeto, sem fazermos apresentações.

Luciana Bugni – A internet ajuda e também pulveriza. É claro que é difícil para uma banda independente lotar uma casa de espetáculos se existem mais trilhões de bandas independentes de qualidade pipocando na internet e todo mundo tem acesso a tudo. Sem a divulgação na rede, o 1/2 Duzia não teria o alcance que tem. É pouco, mas é nossa partezinha.

Daniel Carezzato – A internet não resolve todos os problemas. Ninguém sabe qual é o segredo para se conseguir bons resultados. Lançamos uma música ano retrasado, quando rolou aquele caso da Geisy... Fizemos o vídeo rapidamente e tivemos um boom de acessos. Milhares de pessoas ficaram sabendo que o 1/2 Dúzia de 3 ou 4 existia. 

Thiago Melo – No primeiro dia tivemos 300 mil acessos na UOL, uns 250 mil no R7 e umas centenas de milhares no Terra também. Foram quase um milhão em 24 horas. 

Daniel Carezzato – Nesse sentido, a internet é muito boa. Mas  não o suficiente para que superássemos as nossas dificuldades em divulgar um trabalho autoral e ter algum retorno. E isto é uma luta constante para todas as bandas. 

BD – E como surgiu a idéia do projeto “O fim está próspero”?

Thiago Melo – Tínhamos acabado de lançar o “Tudo se torna” e veio aquele vazio existencial pós-parto, porque você bota o filho no mundo e já não tem mais nada para fazer.

Luciana Bugni – Você quer engravidar de novo! [Risos].

Thiago Melo – A ideia na verdade surgiu em um e-mail de duas linhas: “Vamos fazer a trilha sonora do fim do mundo e lançar uma música e um videoclipe a cada dois meses?”. Veio de uma noite, de um estalo mesmo. A banda já estava formada e havia rolado umas músicas meio apocalípticas. O Marcão tinha feito o refrão da "Esquecimento global" e outra música sobre o furacão Katrina: [Cantarola] “Uma tal de Katrina não gosta de jazz, levantou uma onda de não sei quantos pés”... Olhamos essas duas músicas e: “Porra! É o fim do mundo! É 2012"! Veio o estalo! A partir daí, sentamos, mapeamos uns quinze temas e pensamos em ídolos que gostaríamos que participassem do projeto. Foi aí que a Luciana entrou para a banda e, mesmo sem tocar nenhum instrumento, topou o desafio de pensar o conceito e as composições de “O fim está próspero” conosco. 

Luciana Bugni – Nos comprometemos a lançar uma música e um clipe de 1º de abril de 2010 a dezembro de 2011 e percebemos que um projeto tão longo não sobreviveria em uma única plataforma: Atualmente as pessoas assistem música, ninguém mais escuta sem ver a imagem. Havia uma aceleração natural: “Vai acabar o prazo! Vai acabar o prazo”! Precisávamos finalizar as músicas para gravar em estúdio e fazer o vídeo. Nesse período aquecíamos o projeto nas redes sociais: “Ó, estamos lançando! Ó, estamos fazendo isso”! A internet ajudou muito a divulgação do trabalho.

Daniel Carezzato – Além da divulgação, a gente usa a internet para compor. Nesse projeto, as músicas tinham temas definidos e havia a demanda de criar uma música e um vídeo a cada dois meses. Então, boa parte do trabalho foi realizado através da internet. Começávamos uma música, fazíamos uma guia tosca gravada em GarageBand, ou num Logic qualquer da vida e jogávamos na rede. O pessoal da banda ouvia e continuava. A letra ia rodando com todo mundo contribuindo e dando a sua opinião. 

Thiago Melo – 318 e-mails depois, tínhamos uma música. [Risos]

Luciana Bugni – Em “O fim está próspero”, isso deu certo onze vezes.

BD - Neste projeto houve várias participações especiais. Como foi isso?

Thiago Melo – Depois de tudo planejado, fizemos o primeiro convite pro Tom Zé, na música “Classificados”. Ele foi muito gentil e a sua participação abriu uma porta gigante.

Daniel Carezzato – Ele já havia escutado o nosso primeiro disco e topou participar. No “Tudo se torna” gravamos uma música em homenagem a ele e usamos uns samples de “Jogos de armar”: O álbum tem um segundo disco, que ele chama de auxiliar e que vem com samples que foram utilizados no primeiro. A gente ligou para ele e pediu a autorização. 

Thiago Melo – Na seqüência, veio o Abu [André Abujamra], que foi supergeneroso. A gente o conheceu no Twitter. Ele baixou o CD, começamos a conversar e convidamos: “Topa uma roubada”? E ele: “Tô dentro”! [Risos]. Fizemos quase todos os contatos através da internet. 

Luciana Bugni – Com o Arrigo, a Suzana [Salles] ajudou um pouquinho. 

Thiago Melo – Lindona! A Suzana ajudou pra caramba! [Risos].

BD - E a Suzana como é que foi?

Daniel Carezzato – Procurei na internet e achei. Mas o meu cunhado, que já tocou com ela, já havia falado, então foi mais fácil. 

Luciana Bugni – Convidamos o Maurício Pereira em um festival em que ele também se apresentou. Falamos: “Você não quer gravar a nossa próxima música”? Ele topou. A Ana Gilli e a Ligiana são nossas amigas e abraçaram na hora.

Sergio Wontroba – Para o “Samba desenredo”, chamamos o Wandi Doratiotto  [vocalista e violonista do grupo Premê] e o Danilo Moraes. Aos poucos fomos juntando nossos ídolos.

Luciana Bugni – E o Eduardo Diux, dono do estúdio onde gravamos e parceiro do 1/2 Dúzia desde o "Tudo se torna" ajudou muito.

Marcos Mesquita – Aí, na medida em que as coisas iam acontecendo, acrescentávamos temas atuais. Surgiu, por exemplo, a questão de Belo Monte na segunda música [“Esquecimento global”]. Tudo que estava acontecendo era inserido na música do bimestre. 

Luciana Bugni – Em dezembro de 2010, próximo ao Natal, fizemos uma música que fala de consumismo. Depois sobre o carnaval, o samba...

Marcos Mesquita – "Nibiru down, down" [trecho da música "Nibiru geral" que aborta de forma satírica o choque da Terra com outro planeta]...

Daniel Carezzato – Sobre as eleições também.

Thiago Melo – É. Temos esta característica desde o “Tudo se torna”: Fazemos crônicas musicais. Cantamos histórias. 

BD – Nos últimos meses estamos vendo uma enxurrada de clipes desta geração. Vocês fizeram vídeos para todas as faixas do “O fim está próspero”. Como viabilizar um projeto desse porte sem cair no amadorismo? 

Thiago Melo – A gente queria apresentar mais do que música. Depois desse clipe que a gente fez, do caso da Geisy, vimos que dávamos conta de gerar um conteúdo audiovisual e que isso enriqueceria e alimentaria o site, já que o disco seria lançado dali a dois anos. Optamos por essa linguagem para manter o projeto vivo. Queríamos que os vídeos ficassem flutuando no Youtube, para que as pessoas pudessem assistir e não só ouvir as músicas. Cada clipe tem um conceito e, com exceção de um que teve a parceria da produtora Filmes Para Bailar, todos os outros foram concebidos e feitos por nós, com auxílio de amigos editores e outros profissionais.

Luciana Bugni – Sim. Depois da Geisy e do boom de acessos, a gente percebeu que era possível fazer isso, mesmo sendo amador. E chamamos pessoas que estavam a fim de comprar nosso projeto em um esquema totalmente independente. Os atores, diretores e editores convidados tinham sua concepção e sua visão de vídeo, o que enriqueceu muito as idéias e os conceitos que nós levávamos para as reuniões: “Bom, a próxima música é tal. O que vamos fazer"? Tudo na raça.

Thiago Melo – E foi legal porque não esmaecemos durante o projeto. Tinha sempre sangue novo. Conseguimos superar a correria da vida, a preguiça e todas as adversidades que rolaram. Foi um projeto longo e conseguimos terminá-lo antes do mundo acabar. Acredita? [Risos].

BD - O primeiro álbum, “Tudo se Torna”, teve um lançamento físico, já este foi todo desenvolvido para a internet. Vocês planejam torná-lo físico também? 

Thiago Melo – Há três anos, quando lançamos o “Tudo se torna”, ninguém fazia muita ideia de como gerir uma carreira dentro da internet. O modelo de negócio era muito obscuro e existiam muitas dúvidas sobre o acesso gratuito. Por isso pensamos em lançar o CD com uma embalagem diferente e chamamos isto de “o retorno do objeto”. Criamos duas embalagens: uma ecobag e uma escultura de argila [feita pela designer Luciana Fernandes] onde o áudio do disco vinha em um mp3 player. Queríamos que as pessoas usassem o 1/2 Dúzia como objeto de decoração, como utensílio para ir ao supermercado ou à praia...

Marcos Mesquita – E aí nos shows o Thiago falava: “Ó, peguem o CD, joguem fora, baixem o disco no site e usem a bolsa”! [Risos].

Daniel Carezzato – Agora a coisa está mais consolidada. As pessoas sabem que podem baixar as músicas, mas ainda fazem questão de comprar o CD. 

Thiago Melo – Sim. Em “O fim está próspero” não abandonamos a ideia de ter um objeto e estudamos a idéia de fazer caixinha de primeiros-socorros com um kit de coisas que você pode precisar se o mundo acabar: Confete, band-aid...

Luciana Bugni – Abridor de garrafa, isqueiro... [Risos]

Thiago Melo – Ah, queremos fazer o “Calendário meia”, já que essa história do calendário maia deve ser mentira mesmo...

Marcos Mesquita – É, deu preguiça no designer do calendário. [Risos].

Daniel Carezzato  – Será?

Luciana Bugni – Afe! [Gargalhadas].

3 Responses to e o tal do mundo não se acabou...

  1. pai é pai, jogo é jogo e treino é treino, pô!

comente