a bela da tarde


fotos: daryan dornelles


Rio de Janeiro, meados do século XVIII. Já sob os efeitos da missão artística francesa de 1916, a então capital do império se encanta com todo o tipo de novidade vinda de Paris: desde as costureiras francesas e suas maisons que tomam boa parte da Rua do Ouvidor e ditam a moda da época até os cafés-cantantes, com o seu vaudeville e as chansonnettes. Importados dos palcos franceses pelo empresário Joseph Arnaud, um grande número de artistas causam alarde no Alcazar Lyrique, no Casino Franco-Brésilien e em outros tantos teatros cariocas.
São Paulo, século XXI. Uma nova geração de músicos traz à tona uma insuspeita influência tanto da chanson – gênero musical surgido na década de 1940 -, quanto do rock sessentista francês. Assim, inspirado no ícone Serge Ginsbourg, em 2008 o guitarrista Edgard Scandurra cria o grupo Les Provocateurs, realizando uma série de shows com o repertório do músico. No mesmo ano, também envolvido pelo clima boêmio e sensual de Gainsbourg, o projeto 3namassa lança “Na Confraria das Sedutoras”. Pouco depois, é a vez de Fabiana Cozza, ao lado da Orquestra Jazz Sinfônica, realizar diversas apresentações com o seu “Tributo a Edith Piaf” e Tiê lançar em seu álbum de estreia,“ Sweet Jardim”,  a canção bilíngue “Aula de francês”, composta por ela, Flávio Juliano e Nathalia Catharina. Em 2010, sob os efeitos de Jacques Brel, Piaf e dos cabarés, Thiago Pethit grava “Voix de ville”, enquando Renato Godá lança o álbum "Canções para embalar marujos". No mesmo ano, surge o projeto “Le Temps de Souvenirs”, reunindo músicos como Juliana Kehl e Isabela Lages, para celebrar as cantoras francesas da década de 1960. Ainda em 2010, Bárbara Eugênia lança seu primeiro álbum, “Journal de BAD”, fortemente influenciado  por Fraçoise Hardy, Jacques Dutronc e Gainsbourg.
Nascida em Niterói, Rio de Janeiro, Bárbara Eugênia vive desde 2005 na capital paulista. Amiga de Edgard Sacandurra, em 2008 foi convidada pelo guitarrista a participar em seu bistrô de um tributo a Serge Gainsbourg. Na mesma época, convidada pelo produtor musical Apollo 9, esteve presente na trilha sonora do filme “O cheiro do ralo”, compondo uma canção inspirada em poema de Charles Baudelaire. Ainda no mesmo ano, Bárbara participou intensamente do projeto musical 3namassa, composto por Rica Amabis, Dengue e Pupillo – estes dois últimos também integrantes do Nação Zumbi. Em 2009, finalmente passou a se dedicar ao seu primeiro álbum solo: “Journal da BAD”. O título e boa parte de suas letras foram retirados de diversos e-mails confessionais e poéticos que por um longo tempo enviou aos amigos que viviam fora do país. Arregimentando uma constelação de músicos, em sua esmagadora maioria originários da cena cearense e pernambucana, Bárbara contou em seu disco com as participações de: Junior Boca, Dustan Gallas (Cidadão Instigado), Felipe Maia, Pupillo, Dengue, Otto, Karina Buhr, Juliana R. e do iconoclástico Tom Zé. O álbum, lançado em 2010, recebeu diversos elogios, figurando na lista dos melhores do ano em sites e revistas especializas.
Já se preparando para o próximo álbum, Bárbara veio ao Rio em dezembro passado para fazer sua primeira apresentação em solo carioca. Não podendo deixar passar esta oportunidade, o Banda Desenhada convidou a cantora para uma entrevista, realizada pouco antes de sua participação no show de Nina Becker no Studio RJ:

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rio, 40 graus


Junto a qualquer cena ou geração musical sempre haverá ilustradores, designers, estilistas, videomakers e outros tantos profissionais que darão forma, cor e movimento às canções de uma época. Acreditando nisto, o Banda Desenhada convidou o designer Duda Simões para a entrevista desta semana. Nascido em Salvador, mas radicado no Rio desde 1981, Duda, junto com Synesio Neto, Murilo Ferreira e Marcelo Macedo, formam a Tangerina, agência de design responsável por diversos trabalhos em empresas como Globo.com, Complexo B, Coca-Cola, OI, Funart, Centro Cultural Banco do Brasil, entre outras. Duda também vem se destacando devido à sua grande participação nos projetos gráficos de uma boa parte da atual cena musical carioca. Colaborador no design dos álbuns da Bolacha Discos, coautor do projeto Semente da Música Brasileira e responsável pela direção de arte e ilustração dos discos de Seu Jorge, Rogê, Baia, 4 Cabeça, João Hermeto e outros tantos, Duda Simões tornou-se um dos responsáveis pela cara da nova MPB carioca.
O designer recebeu o Banda Desenhada em seu ateliê, Olga, que divide com os artistas Rafael Dória e Mateu Velasco, no bairro de Laranjeiras, e nos contou sobre seu processo de criação, a amizade com diversos nomes da música carioca e o trabalho com a Bolacha Discos, entre outras coisas:

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molho, ritmo e balangandãs


fotos: daryan dornelles


Technopop mexicano, jazz alemão, rock psicodélico brasileiro, country dinamarquês, indie filipino, heavy metal japonês... Em tempos de universalização da cultura, assistimos nas última década uma avalanche de artistas dos mais diferentes pontos do planeta ganhando destaque em diferentes nichos do mercado fonográfico ao articular em seu som, até então taxado de regional ou mesmo folclórico, uma identidade “universal”. Se por um lado há de se comemorar o consumo pelo mundo afora da obra destes artistas, é importante perceber que, para que tal aconteça, se faz necessário a rotulação de seu trabalho por olhos e ouvidos dominantes pouco aptos à diversidade cultural. Assim, para estes, a nacionalidade de um som ganha ar cosmopolita ao agregar-se a um gênero internacionalmente conhecido. Mesmo que, em pleno século XXI, seja um tanto questionável discutir “brasilidade” e que haja pouco consenso sobre de que forma devemos preservar e estimular as tradições e os ritmos ditos regionais, é importante perceber que certos processos estigmatizantes ainda são devidamente estimulados por uma cultura de massa globalizada. 
Ao mesmo tempo, vivemos em um período que se destaca pela efemeridade das tendências e pelo descarte quase automático de artistas que, na estação anterior, foram considerados a grande revelação do momento. Assim, tornou-se imperativo que os jovens músicos, inclusive brasileiros, adquirissem um aspecto amorfo ou, utilizando um termo mais pertinente, líquido, sem se prenderem a um gênero que, por ventura, mídia e público facilmente descartariam após seu consumo. Deste modo, ganhou um tom quase ofensivo a associação dos novos nomes da música brasileira com a agora antiquada MPB, termo que envelheceu rapidamente nos últimos anos e que de fato se viu incapaz de abarcar a pluralidade estética da nova geração. Esta, que em boa parte se autointitula pop, se diferencia de suas predecessoras não só pelas questões estilísticas ou por se ver inserida em um novo contexto do mercado, mas também pela enorme valorização das particularidades inerentes a cada artista, inviabilizando as muitas tentativas de classificá-los por gênero ou mesmo inseri-los em algum possível movimento. 
Representante inconteste de uma cultura universalizada, propulsionada pelo desenvolvimento tecnológico das últimas décadas, a música contemporânea brasileira e, de forma mais nítida a cena independente, ao mesmo tempo em que se tornou mais democrática, potencializando sua diversidade e dando voz a um sem número de artistas das mais variadas regiões do país, vive as idiossincrasias e os tormentos por que passa a cultura de qualquer nação periférica: A busca por uma mobilidade que, se por um lado, a desenraiza e a liberta de qualquer identidade monolítica, por outro, a torna vítima de um mercado cultural globalizado extremamente voraz e competitivo.
Nadando contra a correte e buscando um olhar mediador voltado tanto para a tradição quanto para a contemporaneidade, Fabiana Cozza é um dos casos raros de sua geração que levanta a bandeira da música popular, ou melhor, do samba. Considerada uma das maiores intérpretes da atual música brasileira e dona de uma voz prodigiosa, Fabiana cresceu em meio às rodas de samba paulistanas e ouvindo em casa os LPs de samba e jazz de seu pai, Oswaldo dos Santos, ex-puxador da escola Camisa Verde e Branco. Em 2004, lançou seu primeiro álbum, “O samba é meu dom”. Três anos depois, seria a vez de “Quando o céu clarear”, onde estreitou laços com a música cubana. Em 2008, gravou seu primeiro DVD, no Auditório Ibirapuera, com as participações da cantora Maria Rita e do rapper Rappin Hood. Em 2009, interpretou o repertório de Elizeth Cardoso no espetáculo “Fabianíssima” e, ainda no mesmo ano, realizou um tributo a Edith Piaf ao lado da Orquestra Jazz Sinfônica. Em 2010, ano em que foi celebrado o centenário de Adoniran Barbosa, a cantora realizou uma série de shows em homenagem ao compositor, com a participação do rapper Emicida. Seu terceiro álbum, “Fabiana Cozza”, lançado em 2011, reiterou suas convicções, mostrando uma cantora atenta não só aos grandes nomes da música brasileira, mas também aos novos compositores de sua geração, gravando duas canções de Kiko Dinucci, “São Jorge” e “Santa Bamba”.
Dias antes da estreia de seu novo show no Rio de Janeiro, em dezembro passado, Fabiana Cozza aceitou o convite do Banda Desenhada e nos encontrou no boêmio bairro de Vila Isabel para a entrevista. Generosa, fez uma análise profunda sobre a sua geração e ofício, comentando também a sua trajetória e influências:

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